Lesão LCA: o que é e por que atletas precisam de cirurgia?

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A lesão no ligamento cruzado anterior, mais conhecido como LCA, é uma das mais temidas entre atletas e praticantes de esportes. Frequentemente associada a movimentos bruscos, saltos e mudanças rápidas de direção, essa lesão pode comprometer a estabilidade do joelho e exigir cirurgia para a recuperação completa.

A seguir, explicamos de forma clara e objetiva o que é o LCA, como ele se rompe, quais os sintomas e quando a cirurgia é indicada.

O que é o LCA e qual sua função no joelho

O LCA (ligamento cruzado anterior) é uma das principais estruturas responsáveis por manter a estabilidade do joelho. Ele conecta o fêmur à tíbia, impedindo que a tíbia deslize para frente em relação ao fêmur.

Além disso, o LCA ajuda a controlar movimentos rotacionais do joelho, especialmente durante atividades que envolvem cortes laterais, giros e desacelerações — comuns em esportes como futebol, basquete e vôlei.

Mesmo em pessoas que não praticam esportes de alto impacto, o LCA é essencial para a mobilidade segura no dia a dia.


Como a lesão no LCA acontece: causas e fatores de risco

A maioria das lesões no LCA ocorre de forma não traumática, ou seja, sem contato direto com outro jogador ou objeto. Isso acontece quando o joelho sofre uma torção súbita, como ao pisar em falso ou ao mudar de direção rapidamente com o pé fixo no chão.

Algumas situações comuns incluem:

  • Aterrissar de um salto com o joelho estendido e para dentro (valgo)
  • Parar de repente após correr
  • Rodar o corpo enquanto o pé permanece fixo

Fatores de risco incluem:

  • Desequilíbrio muscular entre quadríceps e isquiotibiais
  • Falta de controle neuromuscular
  • Gênero feminino (devido a diferenças anatômicas e hormonais)
  • Prática de esportes de contato ou com mudanças rápidas de direção

Estudos mostram que o risco de lesão é maior em atletas jovens, especialmente mulheres, e pode chegar a ser 4 a 6 vezes maior em relação aos homens no mesmo esporte​

Sintomas comuns de uma lesão no LCA

Os sintomas mais comuns após uma ruptura do LCA incluem:

  • Estalo audível no momento da lesão
  • Dor imediata e dificuldade para continuar a atividade
  • Inchaço rápido nas primeiras horas (derrame articular)
  • Sensação de instabilidade ou falseio do joelho, principalmente ao mudar de direção
  • Dificuldade para apoiar o pé ou realizar movimentos rotacionais

Nem sempre a dor é intensa, o que pode levar algumas pessoas a subestimarem a gravidade da lesão. Por isso, é importante procurar avaliação médica ao menor sinal de instabilidade no joelho.


Quando a cirurgia é indicada e quais os tipos existentes

A cirurgia de reconstrução do LCA nem sempre é obrigatória. Em pessoas sedentárias ou com baixos níveis de atividade física, é possível tentar um tratamento conservador com fisioterapia, fortalecimento muscular e controle neuromuscular.

No entanto, a cirurgia costuma ser indicada quando:

  • O paciente é jovem e deseja retornar a esportes competitivos
  • Existe instabilidade recorrente no joelho
  • lesões associadas em meniscos ou cartilagem
  • O paciente apresenta falha no tratamento conservador

A técnica mais utilizada é a reconstrução do LCA com enxerto, que pode ser:

  • Autólogo (autograft): quando se utiliza tendões do próprio paciente, como o patelar ou os isquiotibiais
  • Alogênico (allograft): enxerto de doador
  • Sintético (menos comum): usado apenas em casos específicos

A escolha do tipo de enxerto depende da idade, nível de atividade e preferência do cirurgião. Em geral, o enxerto do tendão patelar tem sido considerado o “padrão ouro” para atletas de alto rendimento​.

Diferença entre autograft e allograft

Na reconstrução, os enxertos podem ser classificados em dois tipos principais:

  • Autograft: utiliza tendões do próprio paciente, como o tendão patelar ou dos isquiotibiais.
    • Vantagens: menor risco de rejeição e infecção, resultados favoráveis em atletas jovens e ativos.
    • Desvantagens: possibilidade de morbilidade no local da extração, como dor ou comprometimento funcional.
  • Allograft: utiliza tendões de doadores (bancos de tecidos).
    • Vantagens: elimina a necessidade de lesar outra parte do próprio corpo, o que pode reduzir a dor no pós-operatório.
    • Desvantagens: risco (ainda que baixo) de transmissão de doenças e, em alguns estudos, taxas maiores de falha em pacientes jovens e ativos​.

A escolha entre esses métodos depende de fatores como idade, nível de atividade, e preferências individuais do cirurgião e do paciente.

Por que a cirurgia é tão comum entre atletas?

Atletas, especialmente os de alto rendimento, demandam joelhos estáveis e resistentes a movimentos bruscos para garantir desempenho e prevenir outras lesões.
Em casos de ruptura do LCA, a instabilidade pode afetar significativamente a habilidade para cortar, saltar e girar, atividades comuns em esportes como futebol, basquete e vôlei.
Por isso, muitos atletas optam pela cirurgia para:

  • Restaurar a estabilidade do joelho e possibilitar o retorno ao esporte;
  • Prevenir lesões secundárias, como danos à cartilagem ou menisco, que podem ocorrer em um joelho instável;
  • Acelerar o retorno às atividades competitivas quando o tratamento conservador não é suficiente.

Esses fatores fazem com que a reconstrução do LCA seja amplamente recomendada em ambientes esportivos.


Recuperação: do pós-operatório ao retorno ao esporte

O processo de recuperação após a cirurgia do LCA é fundamental para o sucesso do tratamento. Ele envolve várias etapas:

  • Reabilitação inicial: controle da dor, redução do inchaço e recuperação gradual da amplitude de movimento.
  • Fortalecimento muscular: exercícios específicos para restaurar a força dos músculos que sustentam o joelho, como quadríceps e isquiotibiais.
  • Reeducação neuromuscular: treinamento para melhorar o equilíbrio, a propriocepção e o controle das articulações.
  • Retorno gradual ao esporte: geralmente iniciado com atividades de baixo impacto, progredindo para treinamentos específicos e, por fim, competições – sempre sob orientação profissional.

Cada fase exige acompanhamento próximo de fisioterapeutas e profissionais de educação física para que o retorno seja seguro e eficaz.

Tempo médio de retorno ao esporte após reconstrução do LCA

  1. Retorno a partir de 6 meses é comum, mas não ideal
    Apesar de muitos atletas serem “liberados” por volta dos 6 meses, a maioria ainda apresenta déficits funcionais importantes nessa fase. Estudos mostram que apenas 0 a 7% dos pacientes atingem todos os critérios objetivos de retorno ao esporte nesse período.
  2. Retorno ideal entre 9 e 12 meses
    Adiar o retorno ao esporte para 9 meses após a cirurgia pode reduzir o risco de nova lesão em até 51% a cada mês de espera até esse ponto .
  3. Para casos de alto risco, recomendação de até 2 anos
    Alguns estudos sugerem que o retorno ao esporte deve ser adiado por até 2 anos, especialmente para atletas jovens e competitivos, devido ao tempo necessário para restabelecer a integridade biológica e funcional do joelho .
  4. Retorno ao mesmo nível de performance ainda é desafiador
    A taxa de retorno ao nível pré-lesão é de cerca de 65%, e menos da metade dos atletas retornam ao esporte competitivo no mesmo nível​. Entre atletas profissionais, as taxas variam de 78% a 90%, mas com queda de desempenho em muitos casos.

Mas não é só questão de tempo…

Muitos atletas são liberados para jogar com 6 meses, mas isso pode ser precoce. A maioria ainda apresenta:

  • Déficits de força muscular;
  • Falta de controle neuromuscular;
  • Dificuldade em saltos, giros e cortes.

Por isso, especialistas recomendam uma reabilitação completa com foco em força, controle de movimento e confiança psicológica antes da volta ao esporte.

O que é um “retorno seguro ao esporte”?

Voltar a treinar não significa apenas estar sem dor ou com cicatrização completa.

O que define um retorno seguro?

O retorno seguro é baseado em testes objetivos, como:

  • Força muscular ≥ 90% comparado ao outro lado;
  • Simetria em testes funcionais (saltos unilaterais, agachamentos, etc.);
  • Avaliação do controle de movimento, especialmente na aterrissagem e nos cortes;
  • Confiança psicológica para competir sem medo.

Se um ou mais desses pontos estiverem abaixo do ideal, o risco de nova lesão aumenta significativamente.


O risco de novas lesões e a importância da reabilitação adequada

Mesmo após a cirurgia e durante o retorno ao esporte, o risco de uma nova lesão – seja na mesma articulação ou na contralateral – é significativo.
Uma reabilitação mal conduzida pode deixar deficiências no equilíbrio muscular ou na propriocepção, aumentando a chance de recorrência da instabilidade.
Para reduzir esse risco, é essencial:

  • Seguir rigorosamente o protocolo de reabilitação: cada etapa tem seu papel na recuperação completa do joelho.
  • Realizar avaliações periódicas: testes de força, flexibilidade e equilíbrio ajudam a identificar áreas que necessitam de mais atenção.
  • Manter a prática regular de exercícios preventivos: programas de neuromuscular, alongamento e fortalecimento podem minimizar as chances de novas lesões.

A educação do paciente sobre os cuidados necessários e a importância de um acompanhamento pós-operatório adequado é determinante para um retorno seguro e duradouro às atividades esportivas.

Fatores que aumentam o risco de nova lesão:

  • Retorno ao esporte antes dos 9 meses;
  • Falhas na reabilitação;
  • Assimetria muscular ou de movimento;
  • Falta de treinos funcionais e específicos;
  • Fatores psicológicos, como medo de se lesionar novamente.

A taxa de re-lesão chega a 23% em atletas abaixo dos 25 anos que retornam ao esporte competitivo.

Lesão no LCA: há diferenças entre homens e mulheres?

Sim. As mulheres apresentam um risco até 6 vezes maior de romper o LCA em comparação com os homens em esportes similares. Por que isso acontece?

  • Anatomia do quadril e joelho: maior ângulo entre o fêmur e a tíbia (valgo);
  • Hormônios: influência do estrogênio sobre a elasticidade dos ligamentos;
  • Técnica de salto e aterrissagem: maior uso do quadríceps e menor ativação dos isquiotibiais;
  • Controle neuromuscular diferente.

A boa notícia é que treinamentos preventivos específicos para mulheres podem reduzir bastante esse risco.

A importância da fisioterapia e da reabilitação neuromuscular

A cirurgia sozinha não garante a recuperação. O sucesso depende da reabilitação. As condutas fisioterapêuticas incluem:

  • Controle da dor e do inchaço nas primeiras semanas;
  • Recuperação do movimento completo do joelho;
  • Fortalecimento muscular (especialmente quadríceps e isquiotibiais);
  • Reeducação neuromuscular com foco em equilíbrio, coordenação e controle postural;
  • Treinamento funcional progressivo com saltos, mudanças de direção e simulações do esporte.

Foco apenas em fortalecer não é suficiente. É preciso trabalhar o corpo como um todo.


A lesão no LCA pode ser prevenida?

Sim! Diversos estudos mostram que programas de prevenção reduzem a incidência de lesões em até 50%.

  • Aquecimento dinâmico;
  • Exercícios de força e pliometria;
  • Treino de agilidade e aterrissagem;
  • Reeducação de padrões de movimento;
  • Realização 2 a 3 vezes por semana.

Programas como o FIFA 11+ e o PEP Program são exemplos eficazes, especialmente para atletas adolescentes e jovens adultos.


É possível tratar a lesão do LCA sem cirurgia?

Depende. Nem todos os casos precisam de cirurgia. Existem três perfis de pacientes:

  1. “Copers” (compensadores): conseguem estabilizar o joelho sem cirurgia;
  2. “Adapters” (adaptadores): reduzem o nível de atividade e evitam instabilidade;
  3. “Non-copers” (não compensadores): apresentam instabilidade recorrente e precisam de cirurgia​demille2017.

O que define isso?

Testes funcionais, força muscular, estabilidade dinâmica e objetivos pessoais. Pacientes menos ativos ou com boa resposta à fisioterapia podem optar por tratamento conservador.

Conclusão: o que a ciência nos mostra sobre a lesão no LCA

A lesão do ligamento cruzado anterior (LCA) é uma condição grave que vai além do momento do trauma. Os estudos mais atuais mostram que o sucesso do tratamento — com ou sem cirurgia — depende de um conjunto de fatores:

  • Respeitar o tempo mínimo de recuperação (pelo menos 9 meses, idealmente até 2 anos para atletas jovens);
  • Ter um plano de reabilitação estruturado, com foco não só na força, mas também no controle motor e na confiança psicológica;
  • Realizar testes funcionais padronizados antes de retornar ao esporte;
  • Aplicar programas de prevenção, especialmente em jovens atletas e no público feminino;
  • Avaliar caso a caso a viabilidade do tratamento conservador, já que nem todos precisam operar.

Além disso, os dados reforçam que a fisioterapia especializada e individualizada desempenha papel central na recuperação e prevenção de novas lesões .

A boa notícia é que, com informação de qualidade, acompanhamento profissional e dedicação, é possível retornar com segurança às atividades — e até mesmo superar o nível anterior.


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